
É com muita alegria que inauguramos o Palavras Casmurras, uma página dedicada ao universo da literatura, dos livros e, claro, dos autores! E para começar bem, nada melhor do que uma entrevista gentilmente concedida pela vencedora do Prêmio Jabuti 2023 na categoria Romance de Entretenimento Karine Asth, com a obra “Dentro do Nosso Silêncio”. Entre tramas, criações e desafios, a autora nos conta como superou suas barreiras pessoais e ainda dá dicas a autores estreantes. Confira abaixo:
PALAVRAS CASMURRAS: Karine, como você descreveria o seu processo de escrita criativa? Existe algum ritual ou hábito que você segue consistentemente ao começar um novo projeto literário?
KARINE ASTH: Quando já tenho a ideia e o enredo pronto, gosto de deixar definido os dias e horários em que vou poder me dedicar mais à escrita. Por exemplo, às segundas, consigo tirar entre 4 e 5 horas para escrever. Já nas terças e quintas, a rotina da casa não me permite escrever. Gosto muito de ouvir música durante o meu processo criativo. Tenho ouvido bastante Ludovico Einaudi. E não costumo colocar metas. Escrevo de forma livre. Já teve vezes que escrevi um capítulo (em torno de 4 páginas) num dia, em outras vezes consegui chegar a, no máximo, dois parágrafos.
PC: Muitos escritores têm métodos específicos para desenvolver personagens e enredos. Como você aborda a construção de personagens e a elaboração de tramas envolventes em suas obras?
KA: Acredito que a construção dos personagens é a parte mais importante de um projeto. Se você não tem personagens convincentes, é muito fácil que o leitor abandone a leitura. Quando crio minhas personagens, penso neles como seres humanos. Quais seus maiores medos? Seus traumas? Minha personagem é falante, tímida, insegura, retraída? Me preocupo com as características intrínsecas. Não perco muito tempo definindo o exterior, se o cabelo é castanho ou preto, cor dos olhos, se é alto ou baixo. A não ser que alguma dessas características tenha peso na história.
Quanto à elaboração da trama, não costumo criar do zero. Uso alguma experiência que tenha vivido, mas contada de uma forma diferente do que aconteceu comigo. Como é o caso de “Dentro do nosso silêncio”. O ser humano é muito complexo e, geralmente, parto daí. Dessa complexidade das relações. Quantas vezes na nossa vida nos surpreendemos com atitudes de pessoas próximas? É isso que procuro usar nas minhas tramas.
PC: Karine Asth, quais autores ou obras literárias influenciaram significativamente o seu estilo e a sua abordagem à escrita? Como essas influências se refletem em seu trabalho mais recente, especialmente no livro que lhe rendeu o Prêmio Jabuti 2023?
KA: A autora que mais influencia minha escrita é a Carol Bensimon. Já li todos os livros dela e costumo reler capítulos de livros diferentes enquanto escrevo. É uma relida mais técnica. Observo como descreve uma cena ou um lugar. Observo os diálogos.
Outro autor que me influencia é o Ian McEwan. No seu livro “Sábado”, ele consegue descrever 2 ou 3 horas de uma madrugada em 50 páginas (se me recordo bem) e o leitor não fica entediado.
Às vezes, enquanto escrevo, lembro de alguma cena de livros deles ou de outros autores e, na hora, paro tudo para procurar e reler. Sempre me ajuda muito.
Vale dizer que o livro “Escrever Ficção” do Assis Brasil foi essencial para minha escrita também. Eu o usei diversas vezes. Na construção de personagens, descrição de lugar, escolha de narrador, etc. Indico demais.

A autora e o Prêmio. Perfil pessoal.
PC: Quais obstáculos você enfrenta durante o processo de escrita e como os supera? Algum desses desafios foi particularmente marcante em seu trabalho mais recente?
KA: O maior desafio pra mim foi manter o ritmo. Lembro que quando comecei a escrever o livro, conseguia dedicar em torno de 3 a 4 horas todos os dias à escrita. Com pouco mais de um ano, a rotina na minha casa mudou e acabou afetando a minha produtividade. Como eu já estava com a história bem adiantada, decidi definir prazos e fui me guiando por eles. Nessa época, funcionou bem.
Mas penso assim: nosso maior desafio é a vida que acontece em paralelo à nossa escrita. No segundo romance, por exemplo, eu passei por um tratamento e logo depois uma gravidez. Por isso, o processo com esse livro tem sido mais demorado. Tem hora que precisamos nos adaptar à realidade do momento.
PC: Como você vê o impacto da tecnologia hoje no mundo literário? Essas mudanças influenciam sua abordagem à escrita ou à promoção de suas obras?
KA: Vejo de duas formas diferentes. Em termos de promoção da nossa obra, a tecnologia e o crescimento das redes sociais deram a possibilidade ao escritor de ter mais independência. Não é como há 20 ou 30 anos, que o autor dependia totalmente da editora para colocar seus livros na livraria. Hoje nós mesmos podemos vender nossos livros e promover com mais intensidade.
Em termos de impacto no mundo literário, me preocupo com o tempo que adultos e jovens gastam nos seus aparelhos celulares, seduzidos por vídeos curtos e jogos. Acho que por esse lado, a tecnologia vem afastando as pessoas da literatura. E principalmente, crianças e adolescentes. É muito mais fácil a gente observar uma pessoa (criança, jovem, adulto) com um celular na mão do que com um livro.
PC: O mercado literário passou por transformações significativas nos últimos anos. Como escritora premiada, como você percebe essas mudanças e qual é a sua visão sobre o papel dos escritores no atual cenário literário?
KA: Bom, acho que já respondi um pouco dessa pergunta na questão acima. Mas me aprofundando, a gente vê uma mudança nítida na hora de comprar o livro. Hoje compra-se muito mais pela internet (principalmente, pela Amazon) do que nas livrarias. Ao mesmo tempo, a gente vê livrarias pequenas, mas que tem uma personalidade, como a Mandarina ou a Livraria da Tarde, ambas em São Paulo, sobrevivendo e bem.
Acredito que o papel do autor hoje é o de atuar nas redes sociais de forma mais ativa. Confesso que quando percebi essa necessidade, fiquei muito incomodada. Mas, como escritora, eu quero ser lida. Não adianta eu me dedicar a uma obra e depois deixá-la parada, sem leitores. Então, vejo uma tendência, que é, inclusive, esperada pelas editoras e agências, de que o escritor apareça mais.
PC: Para os aspirantes a escritores que estão começando sua jornada literária, qual conselho você daria com base em suas próprias experiências? Há algo que você gostaria de saber quando começou a escrever?
KA: Bom, eu ainda me sinto começando minha jornada literária, mas pelo pouco que aprendi até aqui, digo que é essencial sentar e escrever. Não importa se o texto está muito longe do que se considera um texto bom. A gente só consegue aprimorar nossa escrita quando escrevemos com regularidade. Não é muito diferente de outras profissões. Não sei se diria que a prática nos leva à perfeição, mas sei nos leva a uma evolução muito grande.
Outro conselho que dou, e que já devem ter visto muito por aí, é que leiam. Não existe escritor que não tenha sido um bom leitor antes. E que mantenha o hábito, como parte da profissão.
Para conhecer mais sobre a autora e suas dificuldades pessoais que inspiraram a criação do seu livro, confira aqui a entrevista concedida a revista Marie Claire. E não deixe de segui-la nas redes sociais, claro!
o livro Dentro do nosso silêncio, é meu novo vício! Maravilhoso!
Muito bom, né, Monique?! 🙂 Agradecemos sua participação! Acompanhe o blog para mais entrevistas e posts ligados ao universo dos livros. XD